Testamos a nova Kawasaki Versys 300

21/09/2017 08:09

Já se foi o tempo em que realizar o sonho de ter uma motocicleta aventureira capaz de levar peso extra e manter boa velocidade de cruzeiro na estrada significava ter de juntar dinheiro suficiente para comprar uma 600. Caso contrário, a alternativa era contentar-se com um modelo de 20 e poucos cavalos equipado com acessórios (para-brisa, protetores de mãos, malas...). Com o lançamento da Kawasaki Versys-X 300 nesta quinta-feira (21) começam a chegar ao país modelos intermediários, assim como já existem entre as nakeds, aliás derivados destas plataformas. E no próximo ano teremos também BMW G310GS, talvez uma KTM 390 Adventure...    

O novo chassi tubular de aço é diferente daquele usado na Z300 e na Ninja, as suspensões têm maior curso e os aros de alumínio DID são raiados, com 19 polegadas na dianteira. Isso diferencia a Versys 300 de suas variações 650 e 1000, crossovers para uso em asfalto com rodas de liga de 17”. A vocação da 300 para uso misto também é reforçada pelos pneus que a equipam no país como parte do pacote de nacionalização em Manaus (AM), os Pirelli MT60 de sulcos generosos já bem conhecidos dos brasileiros desde a década de 1990.

Em comparação com o restante da família 300 as mudanças mecânicas fundamentais na Versys estão no maior ângulo de cáster com garfo de 41 mm de diâmetro em vez de 37 mm, nos cursos de suspensão de 130 mm e 148 mm no lugar de 120 mm e 132 mm (portanto uma elevação não tão grande para uso fora de estrada, enquanto outros modelos ultrapassam facilmente 200 mm) e na relação de transmissão final encurtada. O motor é o mesmo de 2 cilindros e 296cc que entrega melhor rendimento em altas rotações (40 cv a 11.500 rpm e 2,6 kgf.m a 10.000 rpm).

No Brasil haverá três versões: a standard sem ABS por um preço promocional de lançamento em R$ 20.990 (passará a R$ 22.990 em 2018) nas cores laranja e cinza; com ABS por R$ 23.990 (R$ 24.990 em 2018) apenas na cor verde; e a mais equipada Tourer (fotos) por R$ 25.990 (R$ 26.990 em 2018) nas cores verde e cinza, com faróis auxiliares de LED montados em protetores de carenagem e motor, tomada 12V no painel, protetores de mãos, cavalete central e pequenas malas laterais de plástico com capacidade para 17 litros cada. Com a Honda CB 500X agora custando R$ 25.900, a diferença de valor fica pequena por ganhos de performance e conforto consideráveis. A desvantagem da CB é o projeto para uso rodoviário, que não atende quem busca uma todo-terreno de fato. 

Mudanças na prática

A posição de pilotagem e o espaço disponível no banco também mudam radicalmente em relação às 300 irmãs. Como se espera de uma trail as pedaleiras foram instaladas à frente, o assento é mais comprido e largo (principalmente na parte traseira) e o guidão largo e montado em suportes elevados resulta em posição do tronco do piloto ereta, mais confortável. O para-brisa cumpre bem a função de impedir vento contra o peito, deixando apenas o capacete desprotegido. A mesma função têm os protetores de mãos na versão Tourer, que não possuem alma de metal ou mesmo um reforço de plástico rígido fixado às extremidades do guidão para também protegerem de impactos. As malas laterais adicionam bastante à aparência de pequena big trail, mas totalmente de plástico, inclusive nas dobradiças, não transmitem sensação de resistência. Outros dois pontos negativos são a impossibilidade de soltá-las sem ferramentas (por isso não há alças para segurá-las) e a largura reduzida que, embora não atrapalhe no trânsito entre os carros, as torna pouco úteis para levar bagagem, afinal não acomodam nem uma mochila, somente pequenos volumes.   

As suspensões têm funcionamento firme e bem controlado, sem tendência excessiva à compressão do amortecedor ou do garfo (“mergulho” nas frenagens) como é comum nas trail de baixa cilindrada. Garante ótima estabilidade no asfalto, quando a limitação nas curvas fica por conta dos pneus para uso misto. Em um trecho de estrada de terra que fez parte de nosso roteiro de teste a Versys se comportou bem, mas pode-se dizer que foi um off-road leve, de chão batido com buracos de pouca profundidade, no qual o aro 19 ajuda muito e os pneus asseguram tração. Certamente o mesmo trecho não poderia ser feito com tanta velocidade se estivesse com garupa e bagagem ou caso a estrada tivesse buracos maiores, quando os cursos de suspensão mais próximos de uma naked do que de uma trail seriam um fator limitante (os da crossover Versys 650 têm 145 mm e 150 mm, ou seja, são maiores numa moto para asfalto que usa aros 17). O para-lama baixo restringiria o uso no barro e o escapamento sem ponteira elevada impediria a travessia de trechos alagados que cobrissem as rodas.      

Até aqui mencionamos alguns pontos que poderiam ser melhorados, mas o que realmente nos desapontou na Versys 300 foi a falta de modificações no motor para esta nova proposta. Alterações no sistema de alimentação, no comando de válvulas e nas relações de transmissão primária poderiam resultar em mais torque em baixas rotações, além de uma curva mais progressiva, tão desejável numa moto que se propõem a carregar mais peso e transpor trechos fora de estrada com obstáculos. Encurtar a relação final resultou numa subida de giros mais rápida do que na Z300, sim, num motor que continua lento até 6.000 rpm, que pede para se queimar embreagem nas acelerações com garupa e/ou bagagem e que precisa de reduções de marcha para retomar velocidade rapidamente, caso de ultrapassagem na estrada.

Curta demais

Em 6ª marcha a 100 km/h a Versys está a 7.500 rpm, o que torna uma viagem em velocidade de cruzeiro moderada desconfortável por causa do nível de ruído e vibração, como se ainda faltasse uma marcha acima. O encurtamento da relação e a maior área frontal, com um para-brisa alto, também reduziu a velocidade máxima: houve trechos planos em que o velocímetro avançou lentamente depois de 130 km/h e não alcançou 150 km/h; numa descida em condições mais favoráveis, sem vento contra e com piloto escondido atrás do para-brisa, foi a 162 km/h. OK, as malas atrapalham um pouco a aerodinâmica, nem tanto para justificar uma velocidade máxima tão modesta com um motor de 40 cv. Na prova de 0-100 km/h precisou de 7s71, contra 7s08 da naked Z300. Já nas medições de retomada em 6ª marcha a Versys se beneficiou da relação encurtada e com mais rotações nas mesmas velocidades que são padrão do teste deixou a Z para trás. Com 5 kg a mais do que a naked na Versys ABS, além dos 9 kg de acessórios desta Tourer, totalizando 184 kg ou 14 kg a mais, ao frear também influenciaram o centro de gravidade elevado, afetando o equilíbrio, e a menor área de contato da borracha dos pneus com o asfalto (há mais sulcos): foram percorridos quase 58 metros no 100-0 km/h, 4,7 metros a mais do que a Z300.

Para nós fica a impressão de que a Kawasaki evitou ir fundo nas modificações que seriam desejáveis para esta proposta de uso e acabou produzindo uma moto que não tem torque nem cursos de suspensão desejáveis para todo-terreno, e que não é totalmente adequada para asfalto por causa dos pneus e das restrições impostas pela relação de transmissão. Com as mesmas rodas de aro 17 e pneus mais largos de Z300 e Ninja estaria pronta para ser uma pequena crossover, assumidamente para viagens por asfalto, embora a missão de viajar carregando mais peso ainda fizesse desejável uma revisão no motor para antecipar a entrega de torque.

O lançamento de uma versão mais barata sem ABS foi uma surpresa, já que poderá ser vendida apenas por um ano, até que a obrigatoriedade do freio assistido de série passe a vigorar no Brasil, em 2019. Nesta faixa de preço realmente há um vácuo de opções, mas a partir da versão ABS e ainda mais com a Tourer a chegada da BMW G310GS por preço semelhante disputará atenção de quem busca uma todo-terreno. Já quem prioriza asfalto e não pretende ir além de uma estrada de terra batida terá custo-benefício mais interessante na CB 500X. 

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