31/03/2016 11:07
O relógio começava uma contagem regressiva de um ano e meio quando a fabricante de pneus francesa Michelin entrou em acordo com a organização da MotoGP para seu retorno à categoria. Depois de participar de décadas de conquistas com Barry Sheene, Freddie Spencer, Kevin Schwantz e Valentino Rossi – para citar apenas um campeão por década, desde os anos 1970 – a fabricante deixara a categoria no fim de 2008 a partir da chegada da japonesa Bridgestone como fornecedora única a todas às equipes. Com sete anos de ausência, apesar de a divisão Motorsports da Michelin continuar ativa em grandes campeonatos como o mundial de endurance, CIV, CEV e diversos outros de superbikes, um intenso trabalho de desenvolvimento seria necessário para estar com os novos pneus prontos (ou quase) quando o GP de Valência encerrasse a temporada 2015 e já no dia seguinte começassem os testes oficiais com os protótipos de 2016.
Ao contrário da Bridgestone, a Michelin não acumulara anos de testes e corridas acompanhando a evolução das motos da categoria. “Um ano e meio pode parecer muito, mas na realidade não é”, diz Mathieu Vannson, que assumiu a missão como diretor de desenvolvimento para motocicletas. “É um trabalho fascinante, no qual objetividade e humildade são vitais. Você também precisa ser capaz de traduzir as informações que os pilotos dão inclinando a cabeça e movendo as mãos”, acrescenta, sorrindo.
Após somente dois testes com os pilotos no primeiro semestre de 2015, o nível de estresse da equipe aumentava na mesma proporção que o tempo restante diminuía. Em agosto poderiam testar após o GP de Brno, na República Checa, e no fim do mês seguinte em Aragon, na Espanha, última oportunidade antes de começarem os testes oficiais das motos 2016. A chuva não permitiria o uso dos pneus slick em Brno, o que só aconteceu na próxima oportunidade, quando 14 pilotos avaliaram uma seleção de quatro pneus dianteiros e três traseiros. “Os traseiros só tinham diferenças nos compostos, mas os dianteiros tinham três tipos de construção e duas variações de compostos”, explica Piero Taramasso, diretor de Motorsports.
Os três meses de trabalho intensificado avaliaram diferentes alternativas, tiveram algumas quedas de pilotos e levaram a modificações nos pneus em função dos comentários deles, provando rapidamente que o traseiro estava bem resolvido e o dianteiro ainda precisaria avançar. “Progredimos bastante quanto ao comportamento do pneu durante a frenagem e a aderência em inclinação máxima, mas apesar dos tempos de volta serem bons ainda havia espaço para melhorar”, lembra Taramasso. Para o diretor, após anos correndo com a Bridgestone, seria inevitável também que os pilotos tivessem de se adaptar e as motos passassem por ajustes.
O desafio está na frente
O time que trabalha no desenvolvimento dos pneus para a MotoGP inclui profissionais com alto nível de especialização, caso da engenheira de apenas 29 anos Audrey Moyal. Ela atua no desenvolvimento de pneus dianteiros para uso esportivo há cinco anos e defende que componentes para um ambiente tão competitivo requerem pessoas com experiência e conhecimento em áreas de especialização bem definidas. “O pneu dianteiro é o mais complicado nas motos porque seu desenvolvimento se baseia em grande parte no feedback subjetivo. O traseiro reage à potência da moto, enquanto no da frente influi a frenagem, o ângulo de inclinação e nível de confiança do piloto”, esclarece. “Por isso é mais importante traduzir os comentários dos pilotos sobre o que sentiram do pneu do que coletar dados.”
Passados os testes de Valência os pilotos estavam satisfeitos com o pneu traseiro, amplamente elogiado pela evolução de aderência que representa sobre o de 2015, mas ainda pediam ajustes no dianteiro até o início desta temporada, no GP do Catar, que ocorreu há quase duas semanas. “Novos pneus significam muito trabalho de adaptação no estilo de pilotagem e na geometria da moto”, avalia Aleix Espargaró, da Suzuki. “Agora preciso trabalhar a frente de outra maneira para manter a aderência e tirar vantagem de ter mais atrás, o que significa levantar a moto rapidamente no meio da curva e acelerar antes”.
A Michelin planejou mais modificações no composto para os testes pré-temporada, já em fevereiro deste ano, para que os ajustes fossem concluídos com os novos feedbacks dos pilotos ao longo das três sessões gerais marcadas em Sepang, Phillip Island e Catar. Além da mudança nos pneus e aros de roda, que passam de 16,5 para 17 polegadas, a temporada 2016 exigiu adaptações à nova central eletrônica fornecida pela Magneti Marelli como equipamento padronizado a todas as equipes, o que no GP do Catar provou ter equilibrado forças entre Honda, Yamaha e Ducati, com a Suzuki ainda um pouco atrás e a recém- chegada Aprilia em processo natural de desenvolvimento das novas motos para a categoria. "Os pneus foram bem, mas a eletrônica atual exige mais sensibilidade no acelerador", analisou Jorge Lorenzo sobre o desempenho com a Yamaha, depois de vencer a primeira prova do ano. O segundo round dessa batalha será o GP da Argentina, transmitido a partir de 16h deste domingo, em que Lorenzo admite que todos terão um trabalho de adaptação mais difícil pela frente, afinal no Catar tiveram a vantagem de já conhecer o comportamento da moto no circuito por causa dos testes na pré-temporada .